No centro de
Luanda, capital angolana e província com quase sete milhões de
habitantes, é cada vez mais visível o número de portadores de
deficiência, desempregados, que buscam por esmolas, queixando-se da
desatenção das autoridades.
São
crianças, jovens, adultos até mesmo idosos, facilmente identificados
por entre o caótico trânsito de Luanda, mercados ou mesmo nas paragens
de táxi que, com as mãos estendidas e muitos em cadeiras de rodas,
acompanhados dos filhos, lançam a quem passa o já 'tradicional' apelo:
"Dá só 100 [kwanzas, 50 cêntimos de euro]".
"Estou aqui na
rua a pedir esmolas porque, devido ao sofrimento, não trabalho, não
tenho o que fazer para me sustentar, por isso peço esmolas às pessoas
que por aqui circulam para ver se consigo qualquer coisa para comer",
explicou, cabisbaixo.
De cadeira de
rodas rudimentar, este ex-basquetebolista paralímpico, proveniente da
província do Huambo, conta que visve num quarto onde paga renda mensal
de 3.000 kwanzas (15,30 euros) e que na rua pode conseguir entre 500 e
2.000 kwanzas (2,50 a 10 euros) por dia.
"Depende muito
do dia e da boa vontade das pessoas que passam, o bocado que consigo
aqui faço algumas economias e no fim do mês faço o balanço. Pode chegar
mesmo aos 10.000 kwanzas [50 euros] e aí consigo pagar a renda de casa e
comprar comida e roupa", explicou.
Sem qualquer
formação profissional e com o ensino médio concluído, Alberto Kito diz
que não conseguiu ingressar na universidade por falta de condições e de
apoios. "Já batemos várias portas e estamos cansados pela falta de
sensibilidade de muitas autoridades, porque já falamos tanto e nada. Não
tenho casa, emprego, não tenho nada. Pedimos tanto e nada resultou",
lamentou.
No mesmo tom de
desalento fala Marcelina Adão, de 55 anos, também portadora de
deficiência que há seis anos pede esmolas na mesma zona de Luanda, onde
'vive' de segunda a sexta-feira.
"Sou viúva,
vivo com os meus três filhos que também não têm emprego e para me ajudar
apenas fazem alguns biscates. Sou católica, rezo e durmo aqui na igreja
da Sagrada Família durante 4 dias e depois regresso a casa", revelou.
Marcelina Adão
diz ser costureira de "blusas e sacos de pão" e confessa que "gostava
apenas" de ter uma máquina de costura "para remediar a vida", por estar
cansada de pedir esmolas.
"Estamos a sofrer, o nosso dia aqui na rua é muito difícil, outros nos dão
más respostas e dizem coisas muito chocantes", desabafou, numa pausa
entre os pedidos que vai fazendo aos automobilistas sempre que o sinal
vermelho do semáforo está ligado.
Ali próximo, no
emblemático largo do 1.º de Maio, o cenário é idêntico. É lá que Gaspar
Pedro, de 28 anos e também portador de deficiência, tenta "fazer pela
vida", queixando-se igualmente da falta de apoio das associações do
setor.
"Dizem que dão
apoios aos deficientes, mas nós aqui nunca vimos nada. Daí precisamos de
uma associação séria, aqui várias vezes aparecem pessoas a nos criticar
por estarmos aqui a pedir esmolas", confessa.
Há um ano a
pedir ajuda nas ruas de Luanda, afirma que atravessa várias dificuldades
e que pouco que recebe das "pessoas de bom senso" não chega para pagar
as despesas.
"Muitos aqui
até manifestam vontade de ajudar, mas também se queixam da crise e então
nada conseguem nos dar. Uma crise que apenas afetou a nós, que somos
pobres e estamos a sofrer", atirou.
Com o sexto ano
de escolaridade e sem possibilidades para dar sequência aos estudos,
Gaspar Pedro queixa-se ainda que a discriminação geral à pessoa
portadora de deficiência em Angola.
"Apenas estou
aqui devido as dificuldades que atravessamos. Aquelas pessoas que acham
que podem ajudar ajudam e outras apenas olham e nada dizem", lamentou.
A Lusa noticiou
em abril que mais de 50 pessoas portadoras de deficiência procuravam
diariamente por ajuda nas instalações de Luanda da Associação Nacional
dos Deficientes Angolanos (ANDA), com o seu presidente a assumir estar
"preocupado" com a situação.
Silva Lopes
Etiambulo apontou a "incapacidade da instituição" em responder à demanda
e fez saber que a busca por uma residência e um emprego lideram a lista
as preocupações dos deficientes em Luanda.
De acordo com o
responsável, a instituição que dirige controla mais de 49.000 pessoas
com deficiência cuja situação "continua ser preocupante", com grande
parte destes transformados em "mendigos", pelas ruas da capital
angolana.
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