Os sucessivos governos inconstitucionais que o
Presidente da Republica José Mário Vaz tem impingido ao povo Guineense nesta
legislatura de má memoria coletiva, continuam a fazer mossa no aparelho de
Estado, violando leis, invertendo regras e ferindo a moral e ética de boa
gestão e administração, em prol dos interesses pessoas.
Sendo que todos os executivos forjados pelo Chefe de Estado na base de uma
maioria, que os observadores e críticos mais sensatos descrevem de efémera e
presumida, provocaram “abanões” no aparelho de Estado, este, liderado por Umaro Sissoko,
tem batido todos os recordes, dando mostras de ser exímio na tomada de medidas
nefastas para a vida das populações.
Em menos de 3 meses de exercício, o atual executivo,
que de acordo com a Constituição e o regimento da ANP, entrou em caducidade
desde 13 de Fevereiro de 2017, já entrou em rota de colisão contra tudo e
todos: com os funcionários de carreira, devido às mudanças nos lugares
intermédios na administração pública, com todos os estrangulamentos delas
decorrentes; com os ambientalistas, mediante a autorização para a construção de
uma barragem hidroelétrica numa zona protegida; com comerciantes, mediante o aumento
das taxas de importação; e com os amantes da cultura, com o despejo dos
funcionários da Direcção-Geral da Cultura do seu edifício-sede onde são
promovidas as atividades desse sector estratégico considerado porta-bandeira da
Guiné-Bissau e, subsequentemente, vector importante para a universalização dos
recursos guineenses no domínio cultural, musical e áreas afins.
O último tiro ao boneco foi disparado com a
aprovação pelo Conselho de Ministros do Decreto-Lei que interdita a
participação dos operadores económicos estrangeiros na Campanha de
Comercialização de Castanha de Caju.
Por se tratar de um sector que pode alavancar a nossa
economia, trazemos à reflexão alguns estrangulamentos que a decisão do Governo
pode provocar, não deixando, porém, desse exercício inspirarmos em modelos -
quer já experimentados no passado, quer os que estavam em carteira antes da
rotura provocada com a demissão, sem apelo nem agravo, do Governo então liderado pelo Eng. Domingos Simões Pereira na
fatídica noite de 12 Agosto de 2015.
O apoio e incentivo ao produtor
Sendo a Guiné-Bissau o segundo produtor africano e
quarto produtor mundial da castanha de cajú, a atividade do produtor deve
requerer apreço e reconhecimento da parte do Estado, não devendo se limitar
apenas a manifestações de intenções. O que é mesmo que dizer, a visão, as
ideias e os projetos no sector do caju devem ser traduzidos em benfeitorias
para o agricultor que, com a colheita, dá o primeiro passo, galvanizando toda
uma dinâmica que vem desembocar na exportação de milhares de toneladas com
todas as suas vantagens na tributação, gerando milhões de receitas para os
cofres do Estado.
Aliás, foi nessa base de raciocínio que o primeiro
Governo do PAIGC na Legislatura 2014-2018 elegeu o agricultor-produtor como o
primeiro beneficiário, partindo do pressuposto de que “entre os 3 intervenientes,
ou seja o produtor, o intermediário e o exportador, deve-se valorizar o produto
da venda ...”. Para dar cunho àquela medida, o então executivo solicitara um
estudo do Banco Oeste Africano do Desenvolvimento (BOAD) com o objetivo de
preparar uma lei que estabeleça quanto cada interveniente deve ganhar, mas
sempre com prioridade ao produtor. Isso, sem descurar o papel do intermediário
e o do exportador, ambos protegidos ao abrigo da lei, com vista a conferir
maior visibilidade a esses intervenientes como forma de atrair créditos através
dos bancos.
A exclusão dos estrangeiros
Não se sabe muito bem por que “carga de água” veio a ideia de proibir os
estrangeiros de comprar a castanha de cajú sem que previamente seja preparado
técnica e financeiramente o mercado. Acresce-se o fato de o Decreto-Lei não
oferecer a mínima margem em termos de prazo para a sua entrada em vigor.
É caso para dizer que tudo foi feito
a quente, numa desconsideração aos atores que, com a sua quota, contribuíram
nos últimos anos com mais de 150 bilhões de FCFA para a operacionalização
da campanha e, nessa lógica, excluir os estrangeiros e desconstruir uma
estrutura ou modelo que criou ideias e bases para o sucesso das 2 mais recentes
campanhas (vide a campanha 2015, com mais de 170 mil toneladas exportadas e
2016, com mais de 200 mil toneladas exportadas).
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Especialistas e conhecedores do sector de cajú até
ironizam essa medida, via decreto-lei governamental, afirmando: “Estão a
enganar o povo! Na venda da vaca, dão-nos o rabo e eles ficam com a vaca. Na
realidade, quem irá comprar são os estrangeiros, na capa dos nacionais. E como
diz alguém, os beneficiários serão os eternos empresários guineenses que detêm
o monopólio da exportação, ou seja os mesmos operadores que são também os
maiores devedores do Estado”.
Modelos que evidenciaram maiores resultados
Como reportámos num dos parágrafos em epígrafe, a
ideia de privilegiar o nacional foi equacionada nos sucessivos governo do
PAIGC, mas enquanto uma estratégia de médio e longo prazo cuja sustentabilidade
seria inspirada numa fase piloto na qual dois exportadores (nessa altura o
GETA-Bissau e Gedneral Trading) tinham manifestado interesse em participar,
garantindo a compra da totalidade da castanhas colectada pelos intermediários selecionados.
Na altura, a ideia era de ter 3 tipos de operadores
- Intermediário local: cujo objetivo era enquadrar grupos de jovens e de mulheres nas aldeias que seriam técnica e financeiramente acompanhados para poderem retirar a castanha da mata e colocar em armazéns preparados para o efeito. Pretendia-se com esta politica valorizar a vida no campo e reduzir o êxodo rural.
- Intermediário nacional que seria qualquer pessoa singular ou coletiva devidamente autorizada para o efeito e que teria como missão comprar a castanha no intermediário local e levar até Bissau para vender ao exportador
- Exportador, que comprando no intermediário nacional iria vender para o exterior
Para tal era
necessário ter o estudo para determinar a cadeia de valor, proporcionar
formação aos produtores, intermediários e exportadores, bem como proporcionar
soluções de financiamento junto do sistema bancário para todos os
intervenientes, com base na lei e no conhecimento prévio de quanto cada um dos
intervenientes irá ganhar no negócio.
Para solucionar o
problema do financiamento, estava em fase avançada a instituição dos chamados
“armazéns recibos” que permitiriam a um intermediário local ou nacional fazer
campanha com um montante ínfimo de dinheiro a ser concedido por um banco ou uma
instituição de microfinanças. A ideia é que o intermediário receba, por exemplo
100 mil F CFA, e vá comprar castanha que depois leva ao armazém, receba um recibo a dizer que
entregou a castanha no valor de 100 mil. O banco ou instituição dá-lhe contra o
recibo o montante de 100 mil para voltar a comprar e armazenar.
Com esta operação,
pode-se chegar ao fim da campanha com um volume de negócios superior a
1.000.000 CFA sem ter tido este montante no início da campanha. Isto é possível
com a definição do papel e área de atuação de cada operador de tal forma que o
intermediário nacional não poderá comprar ao produtor diretamente e o
exportador não poderá comprar diretamente ao intermediário local, devendo
passar pelo intermediário nacional.
Desperdício dos ganhos em detrimento da promoção de
tachos para a minoria
Em contraste com essas ideias susceptiveis de
perenizar sucessos e gerar bons resultados na fileira de caju, o Decreto de
Fevereiro de 2017 coloca-nos perante o enigma, se não mesmo ameaça dos chamados
“testas de ferro”. Acontece que os estrangeiros que supostamente dizem
pretender excluir vão criar e financiar.
O perigo maior é que, não
havendo muita concorrência, o preço poderá ser no máximo 500 francos, quando,
em face do valor do dólar no mercado, o preço ao produtor pode ser maior. Ao
limitarem a concorrência, os “testas de ferro” estão a querer garantir lucros
avultados para a minoria catalogada como eternos empresários monopolistas do
sector.
Curiosamente, o Decreto-Lei que vem excluir os
operadores estrangeiros na campanha veio coincidir com o momento em que estavam
em carteira, no quadro do Terra Ranka,
um conjunto de ações deslizantes que tinham sido programadas até 2020, sendo de
destacar entre elas a aposta na transformação local. Basta referirmos o caso do
Grupo OLAM, que tinha abandonado a Guiné-Bissau, justamente no Governo no qual
Victor Mandinga era Ministro das Finanças, com a garantia de só voltar a fazer
campanha e em decorrência investir no sector da transformação do produto quando
o país oferecer condições de estabilidade política e social propensa aos
investimentos.
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Por outro lado, com apoio do Banco Mundial, estava em
perspetiva a compra pela cadeia de super-mercado Norte-Americano WALMART de
todo o cajú transformado proveniente da Guiné-Bissau, o que só viria dar
impulso à indústria de transformação nacional. Tudo está em risco por causa
desse decreto malicioso.
Ilações e conclusões
Depreende-se do conteúdo do Decreto-Lei doses escritas
e literárias da francofonia, com a utilização de termos como “pessoa física”,
que é uma tradução literal de “personne phisique” em Francês. Um erro crasso
pois a expressão correta seria pessoa singular, que se contrapõe a pessoa coletiva.
Esse facto só vem aquilatar, mais uma vez, aquela tendência de copier-coler,
na qual este Governo tem sido exímio, próprio de quem não tem visão e ideias e
que, no entanto, faz recurso a métodos menos convencionais e por vezes mais
ortodoxos, dando vazão a improvisos e engenharias atípicas.
Por Muniro
Conte
Jornalista e Estudante do 3º Ano de Direito
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